Nunca pensei tanto em meu trabalho de cantora como tenho feito de uns meses para cá. Ando fazendo balanços e retrospectivas, pensando nas situações que vivi. Muitas, felizes. Outras, nem tanto.
Graças às situações desagradáveis, cheguei a uma importante conclusão (um tanto quanto óbvia): preciso ser minha maior protetora.
E a partir desta conclusão percebi (não foi a primeira vez, mas espero desta vez usar esta percepção de forma útil) que o "não" é uma das armas mais poderosas à minha disposição. Ele irá me poupar de muita dor de cabeça e frustração.
Mas só
eu posso saber quando tenho que usá-lo. E ninguém pode pronunciá-lo
por mim.
Assim como só eu poderei responder quando me perguntarem por que toquei naquele lugar tão tosco daquela vez. Aliás, vale muito mais a pena dizer "não" a um lugar tosco do que aguentar uma pergunta desconcertante como essa, depois...
Pensando
nisso tudo, percebi que ninguém
irá defender o que faço e o que acredito como eu. Ninguém
entenderá por que não faz mais sentido para mim cantar aquela
(linda,
sem dúvidas) música
do
Caymmi que já cantei 200 vezes.
Ninguém entenderá o que sinto quando canto aquela
música do Caymmi
pela
201a vez. Só eu sei o quanto é
importante para mim cantar outras
músicas.
Só
eu saberei se me sinto ou não vendida cantando essa ou aquela
música, se é sacrificante ou não tocar naquele lugar.
Creio
que ainda receberei muitas propostas de trabalho nada interessantes.
E o que de melhor posso fazer por mim é dizer um "não".
Afinal, sou EU quem ficará chateada o final de semana todo por causa de um show "meia bomba". EU me sentirei exposta de uma forma ruim. Ninguém tem a obrigação de me conhecer intimamente - mas eu tenho.
Muitas
das vezes - e essa é uma certeza absoluta, para
mim -
é melhor ficar em casa fazendo minhas traduções e produzindo
mais dinheiro para que eu possa investir em gravações, em figurino.
Ou ficar em casa fazendo a produção do meu trabalho. Não, não vou
ser "esquecida" se parar de cantar naquele boteco. Lá não sou nem lembrada, quanto mais esquecida. Não, não
sou apenas uma cantora de covers,
sem nenhum trabalho inédito para mostrar. Tenho o privilégio de ter
amigos compositores da melhor qualidade. Tenho a sorte deles gostarem
do meu trabalho e me mostrarem suas canções maravilhosas
em
primeira mão.
Tudo
o que vivi até agora (desde minha banda de rock, passando pelos
shows na noite - restaurantes, barzinhos, praças) serviu para me
encher de experiências, me deixar mais à vontade comigo, me
entender melhor, conhecer mais minha voz, aprender a cantar inúmeras
músicas, ver belas cenas na plateia (pessoas emocionadas),
ouvir pessoas
dizendo coisas incríveis sobre o meu jeito de cantar. Mas serviu
principalmente para que eu tivesse certeza do que queria e do que não
queria. Hoje, tenho certeza que não quero mais fazer nada "mais
ou menos". Quero coisas muito bem feitas e bem planejadas,
sempre que possível. Ou até
um
pouco improvisadas (pois às vezes esses são os momentos mais
mágicos e incríveis), mas da melhor qualidade. Meu foco deve
ser: apenas o melhor! Não
posso ficar preocupada se isso parece pedantismo ou arrogância, pois
para
mim isso
nada mais é do que se
dar valor.
Levar a sério o próprio trabalho. Garantir a longevidade deste,
evitando decepções e desânimos, tão comuns nas carreiras
artísticas. Por isso, é fundamental evitar o máximo de
contrariedades. “Evitar a fadiga”, como lembrou o Dani Medeiros
outro dia. Se tenho uma carreira solo, se não faço parte de uma
banda
e
a maior parte da responsabilidade deste trabalho (cuidar da
logística, das
finanças
etc.) é minha, ao lado do meu produtor, então é claro, é evidente
que as escolhas importantes também devem ser minhas. Não faz
sentido não me respeitar inteiramente.
Mas
se
essa minha atitude (internalizada há alguns meses e finalmente
exposta com todas as letras), mesmo
assim
parecer pedantismo ou arrogância, bem,
só posso me resignar e lembrar que não
tenho
o poder de controlar a
interpretação de outrem. E se isso servir para evitar que propostas
ruins cheguem até mim... Pode ser até algo
positivo.
Não
canto há 20, 30 anos, como tantos cantores por aí na noite, mas
considero que já ralei bastante. E quero continuar "ralando",
pois
amo trabalhar, mas
sem
sofrimentos
e desgastes desnecessários.
Quero
cantar
sempre, até quando eu puder.
O máximo de tempo que me for permitido. Passando por diversas
situações incríveis, fortes, intensas. Como deve ser, mesmo. Mas
com o maior prazer possível.
E
ninguém melhor do que eu para saber o que me realiza, o que me
alegra, o que mais me motiva.