quarta-feira, 30 de outubro de 2013

Responsabilidade

Este post não será muito longo. Apenas fiquei com uma grande necessidade de falar sobre responsabilidade. O intuito é ser mais rigorosa comigo neste aspecto. E talvez escrevendo, organizando as ideias em um texto, fique um pouco mais fácil me cobrar isso.
Há poucas semanas foi marcado um ensaio de um projeto do qual participo. O ensaio aconteceria em Laranjeiras. Durante o dia eu havia pensado o seguinte: não vou me atrasar nem um minutinho. Vou chegar na hora. Quero estar certa (sempre que chego atrasada me sinto errada/culpada, o que às vezes atrapalha o meu desempenho durante todo o ensaio. O desconforto tem este poder). Mas... Aconteceu do Grupo Galpão estar na cidade, se apresentando gratuitamente no aterro do Flamengo (com a peça Os Gigantes da Montanha”). Sábado e domingo eu teria gravações até bem tarde, não poderia vê-los... Como o meu ensaio era às 21h e o espetáculo era às 19h, pensei que seria uma ótima ideia ver a peça e depois partir para o ensaio, feliz da vida. Tudo bem que, para quem estava planejando não se atrasar, isso era um tanto quanto contraditório. Um dos princípios dos pontuais deve ser exatamente aquele de não marcar algo cujo horário seja muito próximo ao horário de um compromisso logo a seguir. Mas resolvi ir.
A peça foi bacana. O problema é que não pude assisti-la até o fim. Outro problema foi que senti um grande desconforto durante mais de uma hora, pois o local estava muito cheio e por isso sentei-me em um lugar muito, mas muito ruim. Outro problema foi que a todo momento eu dispersava, pensando que talvez já fosse hora de eu ir embora. Mas o maior problema mesmo foi ter chegado 10 minutos atrasada ao ensaio. Não houve clima ruim algum com a galera da banda, e um dos integrantes até disse que eu havia chegado “bem” (ou seja, cedo). De fato, eles ainda estavam arrumando as coisas (afinando os instrumentos etc.). E, de fato, ainda faltavam chegar dois integrantes do grupo. Então, sem dúvidas, meu atraso não foi um grande problema para a produtividade do ensaio. Mas o que realmente me incomodou é que eu cheguei atrasada, e ponto. Isso quando havia me prometido que desta vez não chegaria nem um minutinho depois. Cheguei não só um, mas 10 minutos depois do que eu havia combinado comigo.
Fiquei no dia seguinte pensando muito sobre isso. Fiquei refletindo sobre essa minha mania: sempre querendo fazer um pouco de tudo, não priorizando, querendo dar um jeitinho, me desdobrando (ou tentando). Mesmo que no fim acabe dando alguma confusão; mesmo que eu acabe prejudicando outros com isso, não mudo. Eu já havia percebido há algum tempinho que o prazer de fazer algo legal e depois prejudicar um compromisso em consequência disso acabava não valendo a pena. Porque, como já mencionei, acabo ficando com o meu vacilo na cabeça e isso estraga um pouco minha produtividade. Chegar pedindo “desculpe, desculpe” não é legal. Já havia sacado isso. Mas desta vez esta sensação veio com mais força. Talvez porque eu não tenha me atrasado no trânsito; nem tenha me enrolado para sair de casa; nem tenha calculado mal: eu simplesmente estava em uma peça, por puro lazer, e esta não é uma boa razão para não chegar pontualmente em um ensaio. O certo mesmo seria não ter ido. Por quê? Porque existem outras pessoas na jogada que não têm nada a ver com o fato de eu estar com vontade de ver uma peça. (Se o compromisso prejudicado envolvesse apenas a mim, ainda assim seria um vacilo. Mas seria um vacilo um pouco menor.)
Este episódio me fez pensar sobre minha visão de profissionalismo. Me perguntei: o que diabos eu penso de mim como cantora? Eu acho que cantar é uma brincadeira, algo que posso fazer sem me doar 100%? Coloco qualquer outra coisa na frente? Desdenho? Será que é tão difícil assim negar alguma coisa para zelar por esta parte importantíssima da minha vida?
Este texto, como diz o título, fala sobre responsabilidade de forma geral. E o atraso é uma forma de irresponsabilidade. A pontualidade, por sua vez, é amostra de comprometimento. Então achei que seria ótimo para mim (como já está sendo!) escrever sobre isso, divagar, etcetera e tal. Não vou adquirir uma pontualidade britânica assim, de uma hora para a outra, apenas porque escrevi e publiquei isso aqui. Mas certamente vou ficar mais atenta, mais envolvida com esta questão (quiçá envergonhada por não fazer nenhum esforço de melhora depois de discorrer sobre este tema). É verdade que me sinto bem menos mal se o motivo do atraso é algo que “não tive como evitar” (mas quase sempre é possível evitar, sejamos sinceros!) e não algo que beira o desrespeito (por exemplo: ver uma peça), mas quero melhorar de forma geral; não quero ter justificativas perfeitamente razoáveis. A ideia não é essa, ter bons argumentos, uma boa razão para não cumprir o combinado. Já disse Sady Bianchin: se a justificativa do ator que chega depois da hora e atrasa o início da peça servisse para resolver alguma coisa, tudo bem. Mas infelizmente pedir perdão ao público não fará com que o público não espere. 
Acho que as pessoas muito sérias e focadas, as pessoas que admiro profissionalmente, estão acostumadíssimas a deixar de lado uma saída com os amigos, um piquenique ou uma festa para que possam se dedicar a um ensaio, um treino, um estudo. As coisas muito importantes são assim: gostam (e precisam) de muita atenção. E tudo o que faço em relação à música é muito importante - afinal, é o que mais gosto de fazer e é também aquilo que eu faço de melhor.
Posso estar parecendo ser rígida demais comigo neste sentido, mas desta vez esta questão calou fundo, não sei exatamente por qual razão. Afinal, já cheguei atrasada outras (inúmeras) vezes a outros compromissos. Talvez tenha sido culpa do desconforto durante a peça. Foi tão, mas tão incômodo que me levou a repensar minha vida. Tudo tem um lado bom, olhe só. (Uau! Será que se eu tivesse ficado confortavelmente sentada durante a peça nada disso teria passado por minha cabeça?)
Agradeço a todos os pontuais que já conviveram e ainda convivem comigo pela compreensão e pelo bom exemplo. Agradeço a todos aqueles profissionais, responsáveis, que me inspiram e me fazem querer ser mais séria (no melhor dos sentidos) a cada dia. E agradeço também ao Grupo Galpão, por ter me dado a oportunidade de pensar nisso tudo. (Ainda quero ver a peça toda, estava tão boa...)
Um dia eu chego lá! Vamos trilhando o caminho.