sexta-feira, 2 de maio de 2014

Agradar a quem?

Nem sempre é possível agradar. 
Na verdade, é muito fácil desagradar – público, produtores...
E, sem dúvidas, agradar a todos é impossível.


A regra é: sempre haverá alguém insatisfeito. Ponto.

              Lembro de algumas ocasiões em que não agradei como cantora: pela voz, pela interpretação, pelo jeito, por isso, por aquilo. Por estar sem vontade de estar ali no momento (mea culpa); por estar felicíssima de estar lá, mas mesmo assim não agradando, porque... não agradei, oras! Acontece.

              Um exemplo de uma destas ocasiões foi quando cantei, em 2010, em um projeto de forró em Laranjeiras. Acontece o seguinte: adoro forró, gosto muito de cantar este estilo e graças a Deus no meio do ano sempre trabalho bastante em festas juninas, só mandando ver nos xotes, baiões e galopes. Mas nunca fiz parte do circuito de forró, pois não tenho um trio meu; apenas canto como convidada em outros trabalhos. Talvez por isso meu trabalho de forró não tenha agradado naquela noite: eu não fiz como a maioria dos trios faz. Meu grupo não era um trio, para começar. Não tinha uma formação de zabumba, triângulo e acordeon, mas de percuteria, violão e sopro. E não cantei 15 músicas sem parar, por exemplo: fiz intervalos de 5 em 5 músicas, aproximadamente. Achei o resultado ótimo, o repertório bacana (“Bim bom”, do João Gilberto, por exemplo), mas o responsável pelo evento certamente não curtiu, pois nunca respondeu meus e-mails posteriores e comentou com o meu produtor no dia algo do tipo (não lembro exatamente) “a apresentação estava parecendo ‘show’ demais”, enquanto a proposta talvez fosse que fizéssemos algo mais próximo de uma apresentação de bar/restaurante, mais discreta e música para dançar, não para prestar atenção.

               Isso é normal, hoje vejo. Na época gostaria de ter entendido melhor, mas, como já entendi, acho ok não terem gostado. Não me chateia. Acho importante que se tenha visão crítica do próprio trabalho, desde que aliando esta visão crítica às suas próprias convicções. E uma de minhas convicções é: quero fazer outros tipos de trabalho, não um trabalho de forró em uma casa de forró, onde se espera que eu faça assim e não assado. Não. Vou fazer da forma que eu achar melhor. Ou seja: não usando uma formação padronizada de músicos (a não ser que eu ache melhor assim), não cantando 15 músicas sem parar (a não ser que eu e os músicos estejamos empolgados e queiramos fazer assim) e escolhendo canções menos usuais. 
  
                Quando há este conflito de filosofias, é preciso abrir mão de alguma coisa: se não vou conseguir fazer o meu trabalho da minha forma, em um evento específico, então que eu faça meu trabalho em outro lugar, onde eu tenha liberdade total. Ou, então, posso abrir mão de fazer da minha forma e me moldar à forma pré-estabelecida pelo produtor do evento – mas isso não é uma possibilidade. Então, já sabemos qual é a única opção possível.

               Outro exemplo foi quando cantei 'Joana Francesa' a pedido de uma cliente no Mercadinho São José. Ela ficou chateadíssima porque não OLHEI para ela enquanto cantava (sim, acredite, isso aconteceu: a moça reclamou, ignorando o fato de que eu nunca havia cantado a música em público antes, e estava me concentrando para lembrar a letra!). Não posso dar atenção a isso. Não posso considerar isso algo importante, nem levar isso a uma reflexão profunda. Posso simplesmente tentar ser um pouco mais comunicativa com o público, no máximo - ou, melhor ainda, não cantar algo que alguém pediu só para agradar a esta pessoa, que no final ainda ficará ressentida comigo, por pura carência.

“Quem se curva demais ao público fica de quatro para ele, e nunca mais se ergue”, foi o comentário de Hugo Possolo, registrado em um documentário que amo, O riso dos outros. Concordo plenamente. Se eu quiser sempre agradar, se eu ficar sempre preocupada com o que estarão pensando de mim, ferrou. Não poderei me mover. Sempre haverá alguém insatisfeito com alguma coisa, ou até mesmo irritado. Já ouvi críticas de pessoas que não são musicistas, sendo algumas destas críticas quase que ininteligíveis de tão truncadas, mas também já ouvi críticas de "leigos" muito, muito válidas. Cabe a mim fazer o filtro, como já mencionei em um post anterior (“Críticas, sugestões, opiniões”).

Acho importante (ao menos para mim) que se aborde também os fracassos. Os erros, as experiências ruins, as vaias (ainda não as recebi, mas estão aí e podem um dia chegar até mim) e as frustrações são importantes também. Nos ensinam, mesmo que sejam fruto de uma birra ou infantilidade. Não importa. De qualquer forma, nos são úteis, assim como todos os reveses da vida. Nos mostram que não somos invencíveis – porque às vezes nos sentimos assim –, muito menos unânimes. Porque trabalhar com arte é lidar com nosso próprio ego, nosso amor por nós mesmos, nossa vaidade. E alguns episódios, como os que citei, servem para que, minimamente, lembremos: “ei, não estou com essa bola toda!”