Semana
passada fui assistir à peça de um amigo no Sesc Ginástico. Vendo os cartazes com a
programação do mês de novembro, não acreditei: Mateus Aleluia, ex-Tincoãs, iria
se apresentar naquele mesmo teatro, na semana seguinte.
Sou fã
incondicional dos Tincoãs e fiquei animadíssima. Havia pensado, pouco antes de
saber deste show, que se algum dia quisesse conhecer o único remanescente dos
Tincoãs (ao menos o único que gravou discos com o grupo – Erivaldo Brito, da primeira formação, não chegou a gravar nenhuma faixa com os Tincoãs) teria que ir a Angola, onde ele morava. Depois descobri que ele
estava atualmente na Bahia. Mais perto, que bom! Mas saber que ele estaria
aqui, no Centro do Rio, em um show com entrada franca, ainda por cima, foi só alegria.
Mateus,
um verdadeiro príncipe no palco, todo vestido de branco, mostrou uma apresentação
muito diferente daquilo que costumo ver. Quando saí de casa, pensei que às
20h15 ou 20h30 estaria “liberada”, pois o show estava marcado para as 19h. Mas
a apresentação foi até as 21h30, e eu, que
a esta altura já havia entendido que aquilo que acontecera também era uma forma
de esquecermos o tempo lá fora e nos entregarmos, não iria embora antes de
poder dar um abraço neste homem que, com sua voz grave e sua percussão,
abrilhantou canções dos Tincoãs como “Canto e danço pra curar” e “Promessa ao
Gantois”, verdadeiras pérolas, e que havia me dado um grande presente naquela
noite.
Foi
impossível conter as lágrimas ao ouvir Mateus cantar “Cordeiro de Nanã” ou ao
ouvi-lo falar sobre paz e a força do bem. Foi impossível não ficar
impressionada com aquela palestra musical (este, aliás, é o termo utilizado
para definir o projeto; a proposta é esta, e não um show convencional) onde a
sutileza era marcante e onde a informalidade (termo utilizado pelo próprio)
proporcionava um gostoso clima de conversa – mesmo que a presença de Mateus
impusesse uma solenidade e um respeito inquebrantáveis.
Falo de
sutileza porque aquela grande banda (em quantidade e qualidade) – uma voz
feminina, uma percussão, um baixo acústico, uma guitarra e dois sopros – em
muitos e longos momentos apenas aguardava o comando de Aleluia, que contava
suas histórias sobre a África com toda a tranquilidade e as recortava com canções
em dialetos africanos, ou o “Samba da benção” e até “Deixa a gira girar” (um
carinho para os fãs dos Tincoãs). Todos eram grandes músicos, indubitavelmente,
pois respeitavam o conceito do show e a força/delicadeza deste. Tudo aparecia
na hora certa: não havia excessos, mesmo que algumas músicas tivessem uma forma
cuja repetição era quase mântrica.
Na
metade do show, Mateus chamou ao palco um amigo da Bahia, que nos contou sobre
o Recôncavo Baiano e as tradições religiosas da região (em especial, o cortejo
em homenagem à Nossa Senhora da Boa Morte), e logo depois um pequeno documentário
foi projetado no palco. Sim, saí de casa para ver Mateus Aleluia e voltei com o
seguinte saldo: conheci histórias, ouvi lindas músicas, assisti a uma palestra
e vi um filme.
Tirei
foto com Mateus, dei meu CD a ele – que, simpaticíssimo, pediu um “chamegão”,
ou seja, um autógrafo (EU dei um autógrafo a Mateus Aleluia, acho que
invertemos a ordem das coisas!) – e saí do Sesc Ginástico pensando que este
grande artista, que desde a década de 70 está fazendo música da melhor
qualidade, de fato merece todo o respeito e reconhecimento que tem. Merece,
também, muito mais conhecimento por
parte das pessoas: o teatro do Sesc Ginástico deveria estar lotado, apinhado de
gente. Mas isso é assunto para outro texto.
O amigo
de Aleluia que falou sobre o Recôncavo, pouco antes de terminar sua fala, disse
que na opinião dele os músicos estavam mais perto de Deus. Não sei se concordo
100% com isso, pois não gosto muito de pensar que os artistas são especiais,
melhores do que os que não produzem artisticamente, apenas por serem artistas.
Mas acredito que Mateus Aleluia, sim, está tão conectado com sua
espiritualidade (que é evidente em sua música e até em suas palavras) que nos
leva com ele nesta viagem, neste encontro com o que temos de melhor dentro de nós.
Criou-se ali um universo de magia e religiosidade, um ambiente onde sentia-se a
música em sua forma mais conectada com nossas almas – e esta maneira de fazer
arte é uma forma que me agrada muito. Conectar, nos tornar mais humanos ao nos
levar para perto do que temos de mais sensível – ou seja, aquilo que temos de
melhor.
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