quinta-feira, 29 de janeiro de 2015

Parcerias (ou: o Aqui e o Agora)

Pensei outro dia: bem que eu podia ousar e tentar entrar em contato com alguns de meus ídolos musicais.
Eu poderia propor de fazermos gravações juntos. Poderia propor uma pá de coisas. E talvez algum deles topasse, pois muitos destes não são tão mainstream assim. E outros são nomes consolidados, mas a mídia já não dá mais tanta atenção, injustamente. Mas o fato é que poderia rolar, pois alguns artistas acabam trabalhando até menos do que gostariam (mesmo que trabalhem bastante) porque muitas pessoas acabam deduzindo – erroneamente – que estes grandes nomes não têm tempo para nada, e nem interesse em nada que seja novo. Não é verdade: muitos dos artistas brasileiros consagrados querem esta troca com outras gerações, com outros músicos, com outras linguagens.
Continuo achando que esta é uma ideia boa e pertinente, e o pior que esta tentativa poderia me render seria ouvir alguns “nãos”. Nada muito traumático...
Mas há algum tempo, poucos dias depois de pensar nesta possível aproximação com meus ídolos, pensei que tenho amigos músicos que também são ídolos. Por que não pensar em projetos com eles, que são músicos excelentes e estão totalmente abertos a parcerias? E, de quebra, também curtem meu trabalho? Estes artistas estão, sem dúvidas, interessados em unir forças, pois, assim como eu, buscam seu espaço. E toda junção de forças vale ouro.
Me toquei que estas pessoas estão aqui, bem do meu lado, à disposição para ouvir boas ideias. Todos estes meus amigos que também fazem música querem esta ajuda mútua. Então, por que ficar olhando a grama do vizinho se a minha está bem verde? Me toquei de que estou cheia de boas perspectivas – meus ídolos-amigos estão aqui, de coração aberto e interessadíssimos em trabalhar.
Conclusão bem óbvia, esta de me unir a quem me cerca, não é? (Até hoje não fiz uma só grande descoberta que depois não me soasse absurdamente óbvia.) E libertadora também, como várias outras que tenho vivido.
Creio que esta seja uma grande jogada para a vida, de forma geral: nos servirmos daquilo que já temos. Em todos os sentidos, de todas as formas. Se já tenho algumas qualidades, que eu usufrua destas e as potencialize. Se eu tenho amigos, que eu viva intensamente com eles. Se eu tenho oportunidades, que eu as utilize. Sonhar é maravilhoso, mas a realidade também é incrível e deve ser desfrutada da melhor maneira.
É interessante, também, pensar se certos sonhos são apenas uma forma de manter o autoboicote. Se não for, perfeito, mas já vi (em mim e em outros) muito esta atitude de “sonhar alto” para evitar que coisas interessantes acontecessem, uma vez que estas coisas interessantes e possíveis demandam coragem e atitudes práticas.
Outro lado interessante de me unir aos colegas, além de me sentir mais grata (valorizando aquilo que tenho), é perceber que não estou sozinha, e que muitos de nós estamos na mesma situação de fazer grandes esforços e nem sempre ter grandes resultados. Pensar que se está sozinho em uma realidade, além de talvez ser uma postura egocêntrica, é algo bastante duro e sofrido. Ver que a vida é cheia de desafios para todos, e não só para mim, é um grande alívio.
Não há por que dificultar: tenho tudo nas mãos. E seria um grande pecado não usufruir do que já tenho. E o mestre Gil já disse (com outras palavras) que não há outra realidade melhor que a nossa.

O melhor lugar do mundo é aqui e agora”.

quinta-feira, 22 de janeiro de 2015

Ou isto ou aquilo

"Ou se calça a luva e não se põe o anel, ou se põe o anel e não se calça a luva!

Quem sobe nos ares não fica no chão, quem fica no chão não sobe nos ares.
É uma grande pena que não se possa estar ao mesmo tempo nos dois lugares!"

É, nunca será possível estar ao mesmo tempo em dois lugares!

Estou neste momento em uma viagem muito bacana, e isso impede que eu esteja vivendo outras situações, também muito bacanas e interessantes profissionalmente. O que fazer com esta realidade? Pensei e cheguei à seguinte resposta: o melhor a fazer é entender que, de tanto plantar sementes, a colheita vem com força total.
Se eu não tivesse feito um monte de coisas, se eu não tivesse mandado um monte de CDs para várias pessoas da imprensa, se eu não tivesse criado parcerias com outros músicos, se eu não tivesse me dado o trabalho de fazer um vídeo de qualidade para enviar para um teste, nada disso estaria acontecendo agora. Eu não estaria vivendo isso, de ter que aceitar que não posso estar em dois países ao mesmo tempo, declinando o convite do Silvan Galvão para cantar no Cais do Porto, tendo que adiar a entrevista para um jornal, deixando de fazer um teste que me interessa muito,não podendo cantar no lançamento do livro de uma pessoa querida. Se eu não tivesse recebido estes convites, talvez estivesse agora um pouco menos ansiosa/agitada. Mas, acredito, talvez eu estivesse me sentindo ligeiramente frustrada ("por que nada está acontecendo na minha carreira?").
Tenho mais é que agradecer por estar longe do Brasil temporariamente e as coisas continuarem acontecendo; sinal de que estou fazendo tanto que a roda continua girando mesmo sem mim.
Como na natureza - já que usei o exemplo da colheita -, os acontecimentos não se dão no momento que nós queremos. Eles têm seu momento próprio, seu ritmo (que com certeza é o mais adequado, no fim das contas) então só nos resta aceitar. E entender que este caminho é o certo, e é exatamente o que almejo: ter tantas coisas boas acontecendo ao mesmo tempo, que fique impossível atender a todas. Que assim sempre seja!


quarta-feira, 14 de janeiro de 2015

As canções (que curam)




Estes dias revi o filme As canções, do Eduardo Coutinho, já sabendo que rever este filme seria ótimo. Já havia sido um grande prazer vê-lo no cinema, em 2011, e sabia que agora o filme me tocaria ainda mais. (A segunda vez sempre é muito interessante, menos estupefação e mais tranquilidade para absorver...) 
Os entrevistados por Coutinho contam histórias e cantam as canções que marcaram estas histórias, estes períodos de suas vidas. É um filme bastante sensível e, como não poderia deixar de ser, emocionante. Pare para pensar: falar sobre uma canção que marcou sua vida. Isso é forte demais. Apenas um exemplo: um dos entrevistados, Gilmar, começa a chorar inesperadamente (inesperadamente mesmo: é quase um susto para o espectador) ao falar que sua mãe, costureira - que está viva e bem-, costumava cantar a canção “Esmeralda” enquanto cortava tecidos. A nostalgia da infância fala mais alto do que o autocontrole. (Realmente, voz de mãe cantando não é uma lembrancinha qualquer.)
O depoimento de uma das entrevistadas, Isabell, uma capoeirista alemã, aborda algo que acho incrível: a forma como uma canção pode curar. Ela, depois de uma separação, resolveu cantar e cantar, sem parar, o samba “Você me abandonou”, e, graças à mensagem positiva da canção, cheia do clima de “volta por cima”, conseguiu superar a dor. Isabell conta ainda que recomendou a uma amiga que havia sofrido o mesmo baque (separação) que cantasse esta música, e o efeito foi o mesmo. Não só passou, como “arranjou outro namorado rapidinho!”, conta Isabell, rindo. 
(Também já tive esta experiência de cura musical: certo dia, triste, com dor de cotovelo, resolvi ouvir logo uma das canções mais mântricas de Jorge & Gil: “Filhos de Gandhi”. Mandando descer todos os orixás, pura espiritualidade, ouvindo e ouvindo esta canção praticamente um dia inteiro, não deu outra: me curei. E o mesmo aconteceu com um amigo, que ouviu, sem cessar, “Pão doce”, na voz de Clara Sandroni, em um dia ruim. Cada um precisa de uma canção-remédio. Não se esqueça de procurar a sua quando o bicho pegar!)
Em outro grande momento do filme, Coutinho pergunta a Queimado, um entrevistado que conta sua bela (e nada dramática) história de amor: “A música serve para alguma coisa na vida?”. A resposta é enfática: “Eu queria saber como é que alguém que gosta de alguma coisa faz para lembrar se não gostar de música. (…) Como é que faz para recordar de alguma coisa? Tudo bem, pelo cheiro. (...) Mas música, tu canta, tu vai lembrar de alguma coisa.”
Depois de ver este filme imperdível, com uma ideia tão simples e tão boa - registrar pessoas comuns, figuras do cotidiano, resgatando lembranças que estejam relacionadas a canções -, pensei também na questão daquilo que chamamos de amadorismo. Os amadores têm algo que mexe muito comigo, e acho que com todos. Creio que pelo fato de encararem a música com bem menos pressão interna e bem menos tensão, deixando-se levar pela emoção, primordialmente, conseguem emocionar e fazer com que sintamos a música em sua inteireza. Já havia sentido isso certa vez em uma aula de música na escola de teatro Martins Pena. Os alunos do professor Lula apresentaram músicas no formato voz e violão, e algumas delas me tocaram tanto que me surpreendi (gostei de músicas que nunca haviam me comovido até então, entendi melhor o que queriam dizer). Só pude chegar à conclusão de que aquilo havia acontecido porque quem se apresentou estava ali com bem menos vaidade e com muito mais verdade dentro de si do que muitos profissionais (sem jamais querer desmerecer a técnica, que é importante e tem grande valor). O filme As canções me fez ver isso novamente: temos muito a aprender com estes amadores, tão entregues às músicas que marcaram suas vidas.

quarta-feira, 7 de janeiro de 2015

Olha eu aqui, outra vez

Há um constrangimento na vida do artista: a necessidade de falar de si, e falar bastante.
Tenho reparado em mim às vezes um pequeno pudor, quase um saco cheio de mim mesma: “Ah, meu Deus, lá vou eu de novo colocar no Facebook algo sobre mim.” Nem eu mesma me aguento, às vezes.
Mas a questão é que realmente não posso me dar ao luxo de não me divulgar, de não bater nesta tecla. O que faço é trabalho de formiguinha: cada detalhe conta e é muito importante. Cada nova pessoa que conhece meu som é uma grande conquista, e muitas vezes é mais um aliado, que irá recomendar minha música, falar sobre ela, comparecer aos shows etc.
Quando se é um artista independente, então, ser monotemático é mais necessário ainda. Não se pode contar apenas com a força do boca a boca. O artista independente tem que sempre movimentar esta roda, dar o primeiro empurrão da divulgação. Depois, podem até rolar alguns compartilhamentos por parte dos amigos, mas para isso o artista precisa o tempo todo se fazer notar: “Ei, eu existo! Olha minha música aqui! Já ouviu?”.
Bem, mas além do receio de se tornar uma pessoa autocentrada e até narcisista, há também um segundo receio, talvez pior: se tornar um mala sem alça.
Como penso no meu trabalho 24 horas por dia (ou quase), tenho às vezes a impressão de que falo demais sobre ele, mesmo que, na prática, eu talvez não externe tanto assim. Talvez os outros nem estejam tão por dentro do que eu faço. Talvez, até (e este é outro tipo de receio), eu não saiba me divulgar direito, e peque não pelo excesso, mas pela escassez. EITA! Que dúvida!
Será que eu deveria pedir aos amigos que não curtiram minha página no Facebook para que o façam? Será que isso não é um pouco invasivo, não é uma pequena pressão? Meu amigo, afinal, tem o direito de gostar de mim, mas não necessariamente do meu som. E tem o direito de não querer curtir uma página caso não curta de verdade. Delírios da era moderna – parece até engraçado e bobo, certo? Mas também penso que isso pode ser questão de etiqueta virtual.
Meu namorado é artista plástico e escritor, e nós conversamos sobre isso vez ou outra. Sabemos, eu e ele, que é necessário colocar o bloco na rua, sem dúvidas, pois ambos queremos encontrar, comunicar, chegar a outros com o que fazemos. Mas qual o limite desta ênfase em si mesmo? Quando é que esta postura começa a ser quase prejudicial ao artista, tornando-se ele exageradamente autocentrado?
Creio que devo estar escrevendo sobre isso agora porque, apesar de esquecer de registrar vários momentos com colegas de profissão, apesar de não anunciar alguns shows onde participo como convidada por pura distração e apesar de estar precisando fazer uma nova sessão de fotos há alguns meses, tenho andado mais ligada em tudo o que possa ser favorável para mim, e neste pacote incluo também a divulgação. Hoje em dia consigo enxergar melhor que tudo o que faço musicalmente pode e deve ser divulgado, e preferencialmente registrado em fotos/vídeos para atrair mais a atenção das pessoas – sim, são coisas simples, mas que ajudam muito a longo prazo. Então, acredito que esta nova percepção tenha me deixado um pouco impressionada com a quantidade de “eu” que anda rolando. Eu fazendo isso, eu fazendo aquilo, eu neste lugar aqui, eu com esta pessoa acolá... É claro que estou, neste texto, me referindo ao eu-cantora, não ao eu-rotina (nome ruim, mas valeu a intenção), pois este último não precisa ser divulgado por aí.
Mas a questão é que esta minha atitude mais proativa dos últimos meses tem funcionado. Falar sobre mim tem me ajudado, correr atrás de me fazer notar tem me ajudado. Tenho crescido, em vários sentidos. E quero continuar crescendo, por isso as ideias e as ações nunca podem parar.
E que nada disso seja pura vaidade, mas uma forma de promover encontros!