Desde
que iniciei o processo de gravação do meu primeiro CD, Temperos,
uma identidade foi se
estabelecendo, aos poucos. Minha
ideia era colocar
majoritariamente canções minhas, mas fui
retirando aos pouquinhos minhas composições do repertório.
Só
uma
acabou entrando. O disco foi se tornando um disco de intérprete. O
trabalho todo foi ficando com uma cara bem brasileira, e o regional
nordestino falou bem alto (a primeira faixa é um xote e a segunda é
um baião, por exemplo). Ao
mesmo tempo que houve bastante
planejamento e ideias minhas
e do Daniel Medeiros, o produtor, ao mesmo tempo fomos deixando ficar
tudo aquilo que nos chegava e não estava nos planos, mas
era interessante. E
tenho certeza de que tudo aconteceu da melhor forma, no fim. Foram
dois anos e seis meses para que o filhote nascesse madurinho. Graças
a este tempão, acredito, não tive a sensação de que algo
diferente poderia ter sido feito. Fiquei satisfeita e
confiante em relação ao resultado,
e sei que isso é difícil em relação à arte produzida por nós
mesmos.
Hoje (sete meses depois do
lançamento), além de um orgulho deste trabalho feito com esmero,
além da convicção de que meu CD pode
ser divulgado sem problemas por ter a
qualidade que eu almejava,
também já “discordo” um pouco dele. Renegar? Jamais. Sempre
incluirei algumas destas canções nos meus shows, mesmo quando já
tiver vários discos gravados, porque gosto muito mesmo de cantá-las.
Mas o fato é que mal o CD saiu, já senti vontade de fazer outras
coisas, provavelmente diferentes do que havia ali.
Tenho
noção de que é bem comum finalizar um trabalho e já começar a
pensar em outro, diferente, com outro clima, mais de acordo com o
momento que se está vivendo. Mas também é comum querer manter a
mesma onda, continuar na mesma praia, principalmente se tudo fluiu
bem, se o resultado foi bacana e o feedback
foi positivo. Se eu fizer um Temperos
2, tenho certeza de que
vai ficar super legal de novo. Vai ser um lindo disco, cheio de
melodias belíssimas, com um repertório poderoso. E, ainda por cima,
vai ser ainda mais fácil de ser produzido do que o primeiro, porque
desta vez já saberei muito melhor como se faz
um bom CD cheio de
composições de novos nomes da MPB. Um bom CD cheio de músicos de
alto nível. Já terei feito tudo isso.
Mas a questão é que de
fato tenho convicção de que ainda decepcionarei muitas
pessoas que curtem o som que faço hoje. Porque amo, simplesmente
amo, ter liberdade para fazer o que bem quero. É bastante difícil
ser artista solo e ter que arcar com as despesas, sem poder
dividi-las com a banda (como acontece em um grupo, normalmente). Mas
é infinitamente mais fácil no que diz respeito à liberdade, pois o
artista solo não deve nada a ninguém: o
trabalho é dele e carrega o nome dele. É ele quem define os rumos.
Ele sabe o que deve ou não fazer. Ele sabe o que dá tesão ou não
de cantar. Ele sabe qual é o momento de se arriscar, sabe qual é o
momento de viver outras coisas musicalmente. Ele é quem conhece suas
necessidades artísticas (ou ao menos as sente, mesmo que sem
entendê-las muito bem).
É
importante que o artista
tenha esta noção: ele viverá decepcionando os outros. Porque nós,
como seres humanos, também vivemos decepcionando os outros. E isso
não é ruim. É apenas o que acontece quando há alguma expectativa.
Se fiz um CD de MPB, é
natural que se espere isso de mim mais vezes. (Aliás, eu já havia
quebrado algumas expectativas ao lançar o CD, pois houve quem se
impressionasse que ali não houvesse apenas forró e samba, estilos
que eu cantava quase que exclusivamente na noite carioca.)
A
verdade é que amo MPB, amo forró, amo samba, amo rock e amo mais
uma porção de estilos. Mas mais do que amar estes estilos, amo
cantar, e amo a música. E
esta, felizmente, é abrangente demais, nos mostrando que existem
infinitas possibilidades e caminhos.
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