quinta-feira, 4 de junho de 2015

Cara de pau

A frase par délicatesse j'ai perdu ma vie, de Rimbaud, cala fundo no coração dos envergonhados. A timidez, esta característica que pode a princípio ser considerada fofinha, atrapalha e muito a vida de quem é assim. Falo isso de cadeira.
            Imagine o quanto é frustrante perceber que algo bem bacana poderia ter acontecido mas você, tímido, ficou sem graça de mostrar seu trabalho. Ficou sem graça de falar de si. Ficou sem graça de pedir uma ajuda a quem poderia ajudar. Perder oportunidades: taí algo bastante eficiente para se sentir péssimo consigo. 
Mas...
Mesmo continuando tímida, percebi que a cara de pau é um pouco independente disso. Não precisa ser extrovertido. Basta ser cara de pau, mesmo.
Andei percebendo uma mudança em mim neste sentido. Ainda é algo pequeno, mas já ajuda bastante. Tenho percebido que não me importo muito se me acharão uma chata por tentar travar contato com alguém que pode ajudar a divulgar meu trabalho (rádio, TV, jornal). Não tenho me visto tão sensível assim a não-respostas (quando peço o endereço para envio do meu CD a alguém da imprensa, por exemplo, é bastante comum ficar sem resposta). Creio que isso aconteça porque tenho me achado muito certa nesta atitude. Concluo: estou agindo da forma mais coerente para um artista independente, alguém que precisa lutar para aumentar o alcance de seu trabalho.              
(E, aliás, quem não precisa lutar nesta vida? Muito pouca gente, sejamos sinceros - e paremos de achar que correr atrás foi algo que inventaram exclusivamente para a nossa pessoa.)              
Tenho pensado que não importa muito o que acharão desta minha atitude de procurar quem nem me conhece, nunca me viu, não faz a menor ideia de quem eu seja. A opinião de terceiros sobre mim está fora do meu controle. E creio que não exista nenhuma outra forma de agir senão esta. Cabe a mim tentar, mesmo - e por enquanto não posso me dar ao luxo de parar. E, quer sabe? Já consegui muitas coisa graças a esta atitude proativa. Não consegui várias outras com esta mesma atitude, mas estaria bem menos conhecida se não tivesse mexido meus pauzinhos e corrido atrás.                
Bom, também não sou daquelas que insiste em abordar a mesma pessoa várias vezes - isso já não acho que seja bom. Creio que  isso acabe mais atrapalhando do que ajudando. Temos que vencer pelo cansaço, sim, mas não sei se cansando uma pessoa específica. A meu ver, este "cansaço" quer dizer: muitas ações, fazer muito, inventar muito, não parar, gravar, criar parcerias, se divulgar ao lado de outros artistas. Isso "cansa" em um ótimo sentido, fazendo com que você se torne quase impossível de não ser visto. Não dá para te ignorar, porque você está agindo demais, está fazendo sem parar.               
Outro dia estava pensando em pequenas coisas que gostaria muito de alcançar e me vi negativa, pensando em tudo o que ainda não alcancei. Mas percebi que não obter certas respostas ou ser invisível a certas pessoas não me alterava, nem me machucava. Caso alguém esteja me ridicularizando por tentar certas coisas, o que fazer? Nada. Continuar tentando. O "não" já é meu, certo? (Taí uma frase libertadora.)               
Ando cada vez mais entendendo que certas coisas não dependem de mim. Depende de mim ter a ação. A reação, jamais poderei controlar. Não há razão em me manter inerte por isso.              
Se aprendi alguma coisa (e aprendi mesmo, oras!) nesta vida de música, é que a cara de pau, além de ser muito benéfica (aprecie com moderação, é claro - como mencionei, melhor não bombardear ninguém), tem muito a ver com o quanto você se valoriza e acredita no que faz. E no quanto acredita que, cedo ou tarde, vai alcançar várias pessoas com sua arte. (Independentemente do fato de hoje te acharem meio chatinho, ou pouco blasé - e ser blasé, para alguns, é fator dos mais importantes...). 
Tudo, no final, acaba sendo uma questão de fé, e esta é mais uma delas, penso.

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