terça-feira, 7 de julho de 2015

Passando o chapéu

Fiz há poucos dias um show com um amigo. Uma vez que estávamos produzindo o evento, ficamos encarregados de certas responsabilidades. Nós dois decidimos montar o show juntos, portanto era função nossa organizar boa parte das coisas.

Uma destas coisas era o pagamento dos músicos. Estávamos tocando em um espaço da prefeitura, porém não havia cachê, nem cobrança de ingressos: tratava-se de um show ao ar livre, no terraço do local.

Era importante, então, “passar o chapéu”. Era importante conseguir grana para os músicos que estavam lá conosco, e era importante que não tivéssemos prejuízo financeiro (porque, caso não conseguíssemos o suficiente, teríamos que completar o pagamento deles). Era importante, principalmente, que tudo aquilo fosse leve. Eu queria um show que, além de sustentável, fosse gostoso antes, durante e depois. Queria que todo mundo saísse feliz no final. Ninguém no prejuízo, ninguém recebendo pouco depois de se disponibilizar a tirar músicas, ensaiar, passar som e tocar por uma hora e meia. Justo.

Pela minha experiência de tocar na rua e lidar com plateias, já sabia que não funcionava muito deixar um chapéu parado, esperando que o público contribua. O fato é que as pessoas ficam tímidas de ir até o chapéu. Algumas pessoas não o veem, simplesmente. Já outras não ficam assim tão empolgadas em ajudar caso este não apareça ali, na frente delas.
Peguei o chapéu e comecei a passar pelo público. Várias pessoas ajudaram. Várias já tinham ajudado, é verdade, mas a grande massa de pessoas ali quis ajudar no momento em que viram a cantora da banda pedir ajuda, segurando um chapéu, em uma atitude simples, um pedido de contribuição.

Saí feliz e satisfeita com o show, com minha atitude, com o resultado. Ninguém saiu dali “no prejú”. E de quem é a culpa disso? Bem, foi algo que eu disse no microfone, antes de passar o chapéu: “Depois que vi o show do Tom Zé, não tenho mais medo dessas coisas”. E é verdade. Se o Tom Zé (que é o Tom Zé) pede ajuda, se ele é humilde o suficiente para falar sobre seus CDs e livros à venda durante o show, se chega a fazer música com este tema para enfatizar esta necessidade... Quem sou eu para achar que não posso passar um chapéu? Se eu achasse isso, estaria me achando superior ao TZ. E então teria que fazer uma BOA autoanálise, certo? (É, o show deste cara de fato mudou muita coisa dentro de mim, e esta antifrescurite foi mais uma delas.)

Mas a culpa também é da Amanda Palmer, com seu incrível vídeo “The art of asking”, onde ela aborda o quanto é importante que o artista saiba pedir ajuda e também que deixe que as pessoas ajudem, por livre e espontânea vontade. É importante saber receber. É importante saber que esta atitude é uma troca entre o artista e o público, e que isso os aproxima muito.
Pensei que não poderia jamais deixar passar a oportunidade de incentivar que contribuíssem com nosso trabalho. Aquelas pessoas estavam amando o show. Várias compraram nossos CDs. Elas queriam nosso contato, queriam nos conhecer, bater papo. Por que eu me colocaria em um pedestal? Apenas para fingir que não precisava da ajuda financeira do público? Precisava, sim, e continuo precisando. (Aliás, quer comprar meu CD? Entre em contato.)

Estamos na época onde vários artistas conseguem gravar ou fazer shows graças ao crowdfunding. E isso mostrou o quanto o artista não pode mais dar uma de distante. Ele precisa de seu público. E o público está adorando esta proximidade - eu, pelo menos, como público de vários artistas, e como admiradora de vários projetos, adoro quando estas pessoas de que sou fã vêm me pedir ajuda inbox. Acho isso de uma humildade incrível, e amo esta proximidade que acontece. Não bastasse o crowdfunding estar revolucionando, no sentido de estar possibilitando milhares de projetos, ainda está fissurando (em alguns meios, é claro) este lamentável status de “inalcançável” onde o artista muitas vezes se coloca. 

Vamos trocar a arrogância/distância pela troca e pelo contato? Todo mundo vai sair ganhando.  


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