segunda-feira, 25 de julho de 2016

As mulheres e eu

Tenho pouquíssimas parcerias com mulheres. Quando acontecem, são ótimas. Mas por que são tão raras?
Em 2015 fiz o show Tudo quer viver com Claudia Holanda. Também ano passado participei de shows da amiga Dandara Ruffier. Em 2007/2008 cantei no projeto Peneira Gruvi, com Laura Lagub. Já dei algumas canjas em shows de cantoras, e algumas delas deram canjas em shows meus. Mas nada combinado, ensaiado antes, parceirizado mesmo. Tudo no improviso bacana, mas só porque a situação chamou.
Para quem já está cantando há bastante tempo, na verdade isso é muito, muito pouco. Ok, minha primeira banda, formada em 2000, era de meninas majoritariamente. E em 2004/2005 cantei na banda de punk rock feminina Staples. Estas duas experiências foram muito importantes. Ok, legal, mas e depois disso? Quase nada. E se eu for comparar com a quantidade de parceiros homens, fica ainda mais evidente o quanto isso é, repito, quase nada. Já parceirei com Mauro Aguiar, Dudu Godoi, Pedro Logän, Luis Militão, Jurandy da Feira, Adriano Siri, André Gardel, Walter Fernandes, Sandro Dornelles, Amin Nunes, Silvan Galvão e muitos, muitos outros. Fosse cantando em shows deles, fosse compondo, fosse participando em seus CDs, ou convidando-os para cantarem comigo em meus shows, ou gravando suas músicas, ou criando shows em parceria.
No meu CD Temperos há apenas uma compositora presente, Adriana Cunha. E apenas uma participação feminina além da minha, a de Laura Lagub. Nenhuma instrumentista, nenhuma outra vocalista além de mim e da Laura, que também fez a preparação vocal.
Ok, vamos tentar cavar mais: o projeto Doces Cariocas (de cujo CD participei) contava com Alexia Bontempo, além de Pierre Aderne e Marcelo Costa Santos. No show Paneiro Amazônico, parceria minha com Silvan Galvão, contamos com várias percussionistas da Orquestra de Percussão Amazônica – além, é claro, da flautista Gabriela Góes, que faz parte da banda de Silvan. O que mais? No projeto de música infantil Ginjom, Rita Albano e eu éramos as representantes femininas. E Ana Sucha foi a percussionista do show Tudo quer viver no Godofredo. 
  Legal. Mas poucas vezes chamei musicistas mulheres para meus shows solo. Contei com Aretha Nobre no pandeiro em um ou dois shows. Uma vez a baixista Marfa tocou em um show meu, na praça São Salvador, substituindo o músico que sempre tocava comigo. E acho que é isso. Não lembro de outras situações.
Minha vivência com outras mulheres musicistas é tão, mas tão pequena que preciso tentar achar uma explicação. Por que isso? Onde foi que começou este distanciamento? 
Fiquei pensando se não foi a animosidade de algumas mulheres que fez com que eu me afastasse delas. Algumas situações chatas aconteceram, implicâncias estranhas vindas de outras artistas me atingiram desde que comecei a cantar na noite, em 2008. Mas não, esta não é a razão desta distância. Digo isso porque já muito antes, em minha extinta banda, Pic-Nic, que durou cinco anos, fiz pouquíssimas parcerias com mulheres – só lembro de Andrea Thompson e Bia Grabois. Este afastamento vem de longa data.
Desde o final do ano passado venho matutando sobre minha relação com outras mulheres, e tem sido ótimo tentar perscrutar esta questão. Tentar entender o porquê de tanta distância, tanto constrangimento. Com certeza tem muito a ver com admiração e com insegurança. Creio que eu deixe de me aproximar de outras musicistas porque as admire muito, e... “será que serei bem recebida?” Não, nem sempre somos recebidas de braços abertos por outras; nem sempre recebemos outras mulheres de braços abertos. Uma pena! Mas isso não pode nos impedir de continuarmos tentando uma aproximação.
E outro aspecto fundamental é o da competitividade. Esta é muito estimulada entre os seres humanos, de forma geral, mas é disseminada com especial dedicação entre as mulheres. É interessante para a sociedade que assim o seja. Então, lamentavelmente, desde muito cedo nos comparamos e julgamos, mutuamente. E sem dúvidas tudo isso é levado para a vida adulta – e como não seria? E aí quem sai ganhando são as indústrias farmacêuticas, de cosméticos, os cirurgiões plásticos, as academias. A nós, resta apenas o lixo: a competitividade, a desunião e a insegurança. E um sentimento de solidão, é claro.
Tem sido muito importante viver mais atenta a esta questão, pensar sobre “as outras & eu”. Porque felizmente algumas mudanças vêm ocorrendo, e penso que foi graças a este meu questionamento que, por exemplo, as poetas/letristas Karina Limsi e Jade Prata se tornaram parceiras neste ano – e, aliás, isso me deu uma felicidade tão grande que nem consigo descrever por ora. 
O que tenho certeza hoje é que quero fazer música com muitas outras mulheres, pessoas que, tenho certeza, têm tanto a trocar comigo. Ando fascinada por iniciativas como Mulheres Criando e Sonora, grupos e festivais que motivam esta união, este encontro tão importante entre nós, mulheres musicistas.
Ando me sentindo entusiasmada, mais confiante, e sei que, dentre muitas outras razões, isso também tem a ver com a minha aproximação com o universo feminino.
Para finalizar, um chamamento: você, mulher poeta, instrumentista, escritora, cantora etc., chegue junto! Sejamos parceiras – na arte e na vida.